sexta-feira, 16 de julho de 2010

10º e último dia... mendiga Rita

Serei breve e sucinta, porque não houveram sobressaltos nem nada de novo, para além de uma entrevista.
Sim, é verdade, o nosso trabalho foi reconhecido até esse ponto, e não poderíamos ter finalizado da melhor maneira.
Começaram por fotografar todo o processo de transformação. Passei rapidamente de Rita a mendiga, e isto, no meio da rua...
Pela terceira vez, já é de ficar à vontade. Então seguimos todos juntos, de maneira a que eu me pudesse afastar sem dar nas vistas.
Acabei por ir ter ao mesmo sitio em que estive pela primeira vez.
16h, a Baixa estava cheia como nunca, e os minutos demoravam a passar. E mais uma vez, dei por mim a pensar e repensar em tudo, era a maneira mais natural de manter a minha personagem, e aguentar o tempo necessário.
Senti que apesar de visível, voltei a passar despercebida para muita gente. As emoções e as sensações repetiram-se, mas o nervosismo, desta vez não veio comigo. Esteve somente presente, quando me disseram de surpresa, que era eu quem ia realizar o último dia.
As minhas colegas, falaram de toda a experiência, enquanto eu fui acompanhada pelo fotografo do jornal.
Agi normalmente, como se não me estivesse a aperceber de nada e na minha opinião, correu tudo da melhor maneira.
Assim que acabámos a nossa tarde, ligámos de imediato a todos os professores que nos acompanharam. Eles felicitaram-nos por termos chegado até aqui, e nós não poderíamos estar mais orgulhosas.
O projecto acabou e nós ganhámos sem dúvida uma grande experiência de vida.
Foi de facto difícil, mas o grupo conseguiu atingir todos os objectivos e o reconhecimento merecido.
Desde já, um grande Obrigada a todos!
E em breve daremos noticias quanto ao concurso.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

9º dia... mendiga Ana


Com sempre e como habitualmente cheguei à Baixa Chiado e encontrei-me com elas.
Primeira pergunta “estás preparada?” e eu a respondi “não, estou com medo”. Mas mesmo assim entrei nos armazéns voltei a ser a mendiga Ana.
 Saí e disse que queria ir para um sitio mais calmo, porque estava com bastante medo e nervosa como na primeira vez. Voltei a sentir os olhares das pessoas em mim, realmente eu sentia-me super pequenina com os olhares das pessoas, mas graças a deus hoje o dia foi bem calmo, não ouve percalços. O único susto foi quando de repente me vi rodiada por imensos turistas, a olharem fixamente para mim e a dizer: “coitada!” Mas nada de grave.
Depois mais tarde uma jovem rapariga, passou por mim, olhou, continuou a andar, e voltava a olhar, e depois perguntou se eu estava bem e se precisava de alguma coisa, as perguntas que normalmente as pessoas que se preocupavam e nos abordam perguntam.
Bem esta experiencia para mim foi uma grande experiencia de vida. Chegou a um ponto que só me apetecia desistir, mas pensei nas minhas colegas e no projecto e foi isso que me deu força para seguir com isto em frente.

terça-feira, 13 de julho de 2010

8º dia... Mendiga Rita

Mais um dia que me competia a mim realizar...
Desta vez, confesso que o nervosismo não era tão grande, era maior a pressão de não poder explicar, a todos os olhares que por mim passavam, ou a qualquer abordagem, que o que se sucedia, fazia parte de um projecto, e que a minha vida não era aquilo.
Eu sou uma rapariga, de 15 anos apenas, que por enquanto tem a sorte de não olhar o mundo com tamanhas dificuldades.
Então, e mais uma vez, a Baixa-Chiado, foi o ponto de partida. Saí dos Armazéns, já a desempenhar a minha personagem, mas ainda com um sorriso na cara, porque foi a melhor maneira que encontrei de encarar mais uma manhã destas, e novamente descalça, na apaixonante calçada portuguesa, meti-me a caminho à procura do meu refúgio.
Por sugestão da outra Rita, sentei-me nas mesmas escadas em que a Ana esteve no dia anterior. A rua era de facto muito movimentada, e as primeiras abordagens não tardaram. Pois, mal me sentei, passaram no cimo das escadas dois operários que me saudaram apenas, e pouco tempo depois, passou por mim um senhor, que não andava a mendigar, penso, mas a angariar dinheiro para qualquer coisa, e que teve a preocupação de parar, olhar e saber se estava bem. Com um sorriso, pela preocupação que ele teve, acenei convicta que 'sim'.
Voltei a encostar a cabeça às pernas, e sempre com um sentimento de inferioridade, enquanto ali estava, senti que haviam diferenças nos olhares, daí serem poucas as vezes que era capaz de olhar alguém nos olhos.
Muitas faixas etárias subiram e desceram aquela extensa rua, durante o tempo em que ali estive, tendo mesmo de passar por diante de mim, e cada um com a sua reacção.
Os mais jovens eram quem desta vez mais mostrava pena, pelo facto de terem uma idade mais aproximada da minha e não se imaginarem, sequer, na 'minha situação'. Em relação ao resto das pessoas, e das poucas vezes em que tinha coragem de dar a cara, e levantar a cabeça das pernas, foi mais predominante o sentimento de indiferença, senti que para muitas, passei despercebida, senti que não davam valor ao que de mais importante as rodeia.
Como se a maioria dos sem-abrigo escolhesse um estilo de vida assim. Na minha opinião muitos tiveram a culpa de inicio, mas mais tarde já não teriam como remediar. Mas um caso não são casos, e este projecto está a fazer com que tenhamos uma visão mais aberta e dinâmica de muitas sensações simultâneas, enquanto mendigamos.
Decidi voltar a levantar-me e andar...Andar até um lugar mais calmo, onde pudesse finalizar a minha manhã, optei então pelo Terreiro do Paço.
Durante o meu percurso, o que mais mexeu comigo, foi a nova visão que tive dos outros mendigos que por ali se encontravam. Vi de tudo um pouco, dando agora outro valor ao que muitos fazem para recuperar na vida.
Não me saem da cabeça, as caras com que cada um mostrava o empenho que tinha, na maneira mais original de se destacar para obter ajuda. E sem eu me aperceber, despertaram-se muitas emoções em mim. Queria ajudar, mas não sabia como, não sabia sequer se por eles era destacada, nem sabia se alguém sentia a mesma necessidade que eu, de fazer alguma coisa. Porque no fundo eles não são inferiores, levam apenas uma vida diferente, e quem os inferioriza, somos NÓS!
Nunca levei tão a sério uma caminhada pela capital portuguesa, e nunca vi tanta distinção feita, muitas vezes sem se aperceberem.
Só gostava que todos passassem, um dia apenas, pelas dificuldades de cada um. Um dia ao sol, ou à chuva, com muito ou pouco vento e às vezes, sem ingerir comida ou algum líquido. Porque asseguro, que ninguém vai gostar de ver o mundo de baixo para cima.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

7ºdia... Mendiga Ana

Chegada à Baixa: encontro-me com elas, nervosa como no primeiro dia, sempre no sítio do costume.
Entro nos armazéns do chiado como Ana e saio como mendiga, sento-me numas escadas muito escondidas, poucas pessoas passavam por lá...
A Rita disse-me para eu me sentar ao fundo das escadas, para poder ser vista por mais pessoas e para ser mais realista. Fiz o que ela me disse… Sentei-me então ao fundo das escadas e iniciei a representação do meu papel.
Encostada à parede sinto novamente todos os tipos de olhar.
Dirige-se a mim uma senhora que me pergunta se me sentia mal disposta e se precisava de alguma coisa, e eu respondia sempre que não acenando a cabeça.
Passado algum tempo apanhei o meu maior susto. Não tinha visto uma rapariga aproximar-se de mim e assustei-me, ela perguntou se eu estava bem, se alguém me tinha feito mal, se eu queria que ela liga-se para os meus pais, se estava sozinha, onde estavam os meus sapatos, se tinha fome, pedia-me para olhar para ela, acenava sempre com a cabeça que sim ou que não, mas ela sempre a insistir... Eu cheia de medo só a pensar: Rita aparece aqui rápido.
Só que não conseguia fazer nenhum sinal a ela e ela não vinha. Quando a rapariga me diz: “levanta-te, vem comigo até minha casa" perdi a cabeça, só me apetecia chorar e fugir.
Mal ela se levanta faço sinal e peço para irmos embora. Levantei-me e comecei a andar rápido antes que a rapariga voltasse ou viesse atrás de mim.
Perguntei se já havia boas fotografias, porque estava a ser muito complicado continuar. Assim volto a entrar nos armazéns e dirijo-me às casas de banho como mendiga e volto a sair como Ana. Obviamente acabei o dia cheia de medo, mas até que é gratificante.

6º dia... Mendiga Rita

A minha mãe costuma dizer que se mudarmos a nossa atitude para com o mundo o mundo reage e muda para connosco também... Por isso hoje, como já é o meu terceiro dia e já noto alguma habituação a esta actividade, decidi encarar o dia com muito mais positivismo e serenidade.
Entrei nos Armazéns, vesti-me, saí... O costume, mas desta vez não assustada. E não sei se foi o positivismo ou mero acaso mas o dia até correu muito bem!
Sem sobressaltos nem nada parecido, foi só como que estar sozinha... Não precisei de fugir de olhares, nem de palavras desconfortáveis, não tive de desviar a cara, ou esconder-me...
Com o passar dos dias, eu diria que cada vez gosto mais da experiência!